Paraty
- Tamara
Por 6 anos, meu objetivo na vida foi um só. A pele descascada nos meus ombros queimados era prova da minha dedicação para catar conchinhas. Em formato de borboleta, em cor de rosa, estreladas, enroladas e chatas, elas íam para o museu particular que eu tinha no quarto.
Aprendi a reconhecer lugares pelo formato, cor e espessura desses presentes da água. Em Paraty eram pequenas e arredondadas, em São Francisco do Sul, eram mais finas e compridas; no pantanal, marrons e quase esféricas(onde os tuiuius enfiavam o bico), na Antártica, pareciam pirâmides azuladas.
Não sei exatamente em que ponto interrompi a coleção. Minhas irmãs reclamavam do carbonato de cálcio nas mesas do quarto, da areia nos armários e do uso privado do espaço público pela coleção. Um dia percebi que aquelas esculturas eram mais bonitas na beira d’água do que nas caixas transparentes do meu quarto, e que eu podia admirá-las sem possuí-las.
Aos 12 anos nossa mãe nos levou pra mergulhar. Nosso batismo foi em Paraty. E na água benta do oceano, vi o mundo que eu conhecia com a palma da mão e a sola dos pés, tornar-se tão pequeno frente ao universo que existia embaixo d’água. O cilíndro me deixava ir até peixes, tartarugas e estrelas do mar sem que, para isso, eles viessem até mim. Também vi conchinhas. Muitas. E em movimento.Como me enganei ao pensar que eram enfeites; eram habitações para muitos e diversos tipos de moluscos. Descobri, sem graça, que eu guardava, em terra, condomínios abandonados que pertenciam ao mar.
O mergulho me fez acreditar que a beleza existente no ecossistema marinho morria se parte dele fosse levada embora. Se hoje a natureza tem seus ornamentos, levou milhares de anos, seleções e acasos que resultaram na sobrevivência das espécies que protagonizam o presente teatro do oceano.
Difícil pensar assim num tempo em que tudo que a gente gosta a gente quer levar pra casa. Mas acredito que meu prazer não estava no objeto, e sim na experiência de conhecê-lo. E, pra isso, basta a memória.