Diário de bordo

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Desvendar Parafusos

por Tamara

Tinha um vão entre o costado do paratii2 e a draga à qual estávamos atracados. Pulei o vão e corri para a draga feito um macaco pra dar o último abraço nos meus pais, Irmas e nossas amigas, Cris e Tamara, que em silêncio já sabiam desde o começo, na nossa chegada à Abrolhos, que aquilo iria acontecer.

Olhei pras caras do Rafael e do Danilo esperando a indicação de que sairíamos. Motores ligados, toda a tripulação (de 3) no convés em silêncio. “Tem que ter o feeling”, disse o segundo.

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Entre Formigas

- Laura

Dez amigos, seis nacionalidades. Todos em uma pequena van, com destino à Tikal, um sítio arqueológico de ruínas e pirâmides maias. Partimos de San Miguel Escobar pelas 3 da manhã e cambaleando de sono, tornamo-nos zumbis. A viagem  soava como um teste para pessoas ansiosas; seriam 14 horas de resistência. Meta do dia: chegar no parque antes das 5 da tarde. Kit de bordo: uma garrafa d’agua e um saquinho plástico para eventuais descartes ou indigestões alimentares. De um dormitório temporário, a  tripulação da pequena e vermelha vã foi ganhando ânimo ao nascer do sol, assim como os relances na janela, em diferentes tons de verde.

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pantanal estrada

Aos berros

- Tamara

Uma das grandes frustrações da minha vida é não saber tocar um instrumento. Nem um. Mentira, eu aprendi com meu pai a tocar berrante – não sei se conta como instrumento porque é algo que se leva duas semanas pra aprender a tirar alguma coisa, não mais – e também porque nunca vi tocar berrante no municipal, na Sala São Paulo, em show de bandas da moda nem nada – mas eu diria que faz um som bonito e combina com música – que é uma forma de teletransporte.

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XX (4)

Desencontro

-Tamara

Aquele gesto fatal decerto melhor seria se mantido omisso, não fosse a indelicadeza gratuita em declarar, por intermédio de gerados, certas conquistas pessoais post mortem. Devido ao desejo de ambas as partes em manter supostas afinidades, parece-me custoso expor à luz da pena a semente do desconforto — embebido em conveniências. Faz-se necessária a ressalva de que nada tenho contra o intermediador de tal notícia, o qual, ademais, parece-me gente de bem. Dessa forma, proponho-me a discorrer de tal modo que eu mesma possa digerir a causa de tal rodeio memorialístico.

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na verdade

Na verdade,

- Tamara

O sonho é um monte de neve guardado num potinho. Na minha jornada pela superfície da Terra, colecionei suspiros, vi derreterem-se tesouros e reguei a fé que eu mesma assassinei. Minhas utopias materializadas tornaram-se desilusões banais. E me perguntei se era assim que as estrelas morriam, se fazendo visíveis. Mas não. Algumas estrelas expostas na areia da praia podiam  viver, se devolvidas ao mar a tempo.

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cachorro africa do sul

Nota Sobre o Amor

- Tamara

Foi sequestrado em Paraty. Corria ávido pela praia do engenho e, ao nos ver, veio dar em cima. Aquela coisa de pedir carinho, se esfregar na perna e correr atrás do galho que a gente atira. Pelo estado, não tinha dono – enfiamos na caçamba da picape e pegamos estrada.

Paramos na cachoeira da estrada de Cunha. Foi lá o batizado e o banho de água doce pra tirar o excesso de lama com areia dos olhos. Água sagrada de Paraty, padrinho, madrinha e nome: Rufus.

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Não queria ser criança

- Tamara

Era um auditório de uns 70 lugares, cheio de seres humanos com uma mão e meia de anos. Falavam, no palco, três meninas de mais ou menos duas décadas sobre experiências vividas há uma e um livro escrito há meia.

Uma das leitoras não entendia como as 3 palestrantes e as 3 crianças do livro podiam ser as mesmas pessoas. Não eram. Sem saber disso, declarou “queria que vocês fossem crianças”.

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mar drake golfinho

Sublimação intransponível

- Tamara

Pra onde o Pacífico e o Atlântico pelo Sul conversam, damos o nome de Drake. O encontro, no veleiro, é medido em dias: 7, na vela, ou 3, no motor.

Prefiro chamar de conversa do que de discussão. Às vezes, os dois oceanos brigam como pais e filhos falando de política. São dias de cama e jejum, sem sair nem pra ir ao banheiro.  Outras vezes, os oceanos falam de música, de arte, de café. Nesse caso, o mar vira azeite, o barco quase não mexe e parece que nem saímos dos canais chilenos.

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marininha

Teletransporte

- Marininha

Com cinco anos, meu mundo se consistia, basicamente, no caminho de casa para a escola, e na barrenta e sinuosa estrada que nos levava até Paraty. Fora isso, conhecia algumas grandes e tumultuosas “cápsulas do tempo”. Basicamente, você entrava, se sentava comodamente por algumas horas e, num piscar de olhos, as portas se abriam. Um lugar que você nunca tinha visto antes aparecia logo em baixo dos seus pés, ao descer a escadinha do avião.

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Encalhamos por querer

- Tamara

Eu não podia acreditar. Perguntei pra minha mãe se era verdade que estávamos encalhados. Ela fez que sim. O fundo era tāo raso que eu podia andar com água nas canelas. Estávamos em 7 no veleiro: minha família, Rogério e Flávio. Meu pai, tenso, não pensava nas providências a tomar, tomava-las. Iríamos sair dali, mesmo que os mastros flexíveis tocassem a água. Tocavam. Não entendi o que ia se passava, mas senti que quanto mais longe ficasse do foco de resolução de conflitos, melhor.

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